A paixão é uma droga, cara
Para muitas pessoas, uma vida sem paixão acende o sinal de alerta. É sinônimo de tédio, mesmice e ausência de sentido. Desde crianças, somos incentivados a viver a partir de nossas paixões.
A paixão aparece aqui como um motor que nos impulsiona a agir, com a garantia de que, se vivermos a partir dela, seremos mais felizes e excitados.
Ao longo da história, tivemos pessoas célebres e intensas nas artes e na música que produziram seus trabalhos movidos por suas paixões e que, certamente, nos inspiram de alguma forma. Acreditamos que a paixão é fundamental para o nosso sucesso. Isso porque ninguém nos ensinou a relação entre a paixão e os afetos passivos.
Vocês já devem ter ouvido falar de Amy Winehouse. Por trás do sucesso, Amy vivia uma batalha interna. Conheceu Blake Fielder-Civil, e a relação foi intensa, marcada por altos e baixos, drogas e autodestruição. O amor que ela sentia por Blake era uma obsessão. Amy mergulhou em vícios, álcool e dependências que alimentavam suas letras, mas também a consumiam por dentro. A paixão destruiu sua capacidade de autocuidado, e o que a fez brilhar também a levou à morte. Enquanto o mundo aplaudia sua genialidade, ela se afundava na tristeza de um relacionamento caótico e na pressão da fama.
Em 23 de julho de 2011, Amy foi encontrada morta em sua casa, aos 27 anos. A paixão, que deu combustível à sua arte, também a destruiu, sugando sua vida e brilho aos poucos. Amy Winehouse tornou-se o símbolo de uma artista que amou demais, mas perdeu-se no meio de sua própria dor e vícios, incapaz de se salvar.
A história de Amy não é distante de nós. Quantas vezes permanecemos em relacionamentos abusivos apenas porque os altos e baixos nos fazem sentir vivos? Nós, brasileiros, especialmente, somos um povo muito apaixonado, como vimos em outros textos. A política, a música, o carnaval, as novelas e seus romances. Socialmente, tudo parece nos conduzir a exaltar e desejar um modo de vida cada vez mais apaixonado.
A paixão é uma realidade. Nós nos apegamos aos objetos exteriores e achamos que eles nos trarão felicidade.
Quando pensamos em uma realidade feminina, a paixão pode ser um grande entorpecente, como foi no caso da Amy. Colette Dowling, em sua obra O Complexo de Cinderela, demonstra que a paixão é uma forma de as mulheres projetarem, nos relacionamentos românticos, seu desejo de ser salvas. O desejo ser salva, nesse contexto, pode ser encarado como uma busca do narcisismo primário, que deseja obter sempre uma satisfação e um prazer a partir de um objeto exterior. Ou seja: a socialização feminina mantém mulheres no estado de passividade utilizando a paixão romântica como ponte para uma suposta satisfação, mantendo-as dependentes desses estímulos.
"Grandes paixões são enfermidades incuráveis", disse Goethe. Da filosofia antiga até a clássica, a educação das paixões tornou-se o grande centro de interesses.
Quando estamos apaixonados, perdemos o controle de nossas ações, parece que realmente estamos sob efeito de drogas. E estamos mesmo1. Somos capazes de reagir de forma impulsiva a qualquer coisa que ameace nosso estado passional. É por isso que temos muita resistência quando alguém critica a pessoa, a causa ou a ideia pela qual somos apaixonados.
Para Espinosa, as paixões são afetos passivos que resultam de causas externas que nos afetam e, consequentemente, limitam nossa capacidade de ação e de autodeterminação.
Ele define paixões como estados nos quais o indivíduo não tem pleno controle sobre suas emoções, sendo dominado por forças externas. Essas paixões diminuem a potência de agir, uma vez que a pessoa é conduzida por algo fora de sua própria natureza.
Nossa paixão é sempre fruto de uma fantasia e de um apego às expectativas que criamos acerca da realidade. Nós nos apegamos a ela como a uma droga. Sempre que essa paixão é abalada, ela produz em nós um imenso mal-estar, fazendo com que continuemos correndo desesperadamente em busca da sensação positiva que experimentamos na primeira vez.
A paixão provoca reações no cérebro que são semelhantes aos efeitos de certas drogas, gerando sensações intensas de euforia e recompensa. Na obra Dopamina: A Molécula do Desejo, o autor Daniel Z. Lieberman explora a relação entre dopamina e paixão sob a ótica da neurociência. A dopamina é um neurotransmissor associado ao sistema de recompensa no cérebro, desempenhando um papel central na motivação, prazer e na busca por novas experiências. Quando estamos apaixonados, os níveis de dopamina aumentam, gerando sensações de excitação, expectativa e euforia. Isso ocorre porque a paixão ativa o circuito de recompensa, fazendo com que o cérebro antecipe prazer e crie uma espécie de "vício" na presença ou no pensamento sobre a pessoa amada.
Essa relação entre dopamina e paixão é ligada à busca pelo novo e pelo desejo de conquistar. A paixão, assim, não é apenas uma resposta emocional, mas uma motivação bioquímica que nos impulsiona a agir e buscar a recompensa emocional que associamos ao ser amado. Lieberman ressalta que o papel da dopamina não é apenas promover prazer imediato, mas antecipar e manter o desejo aceso, criando um ciclo de expectativas e realizações que alimenta a intensidade emocional característica da paixão.
Certamente, você deve estar pensando que este texto pode soar hipócrita, pelo fato de eu estar em uma relação estável e que, por isso, a crítica à paixão não pode ser feita, afinal, sou uma mulher assumidamente apaixonada. O que fazer diante dessa encruzilhada? Espinosa lindamente nos ensina que o problema nunca será o afeto em si, mas a causa dele. Espinosa demonstra que podemos obter uma alegria mais intensa e duradoura pela via dos afetos ativos. Enquanto as paixões são afetos passivos, ficamos dependentes do que é externo a nós.
No entanto, quando aprendemos a amar ativamente, podemos sentir uma alegria muito mais intensa e estável. Essa alegria nos expande e nos conduz à potência. O problema não é a paixão em si, mas o objeto. Aprender a amar significa aprender a produzir uma alegria de forma ativa; é dessa forma que podemos construir bons encontros e, aí sim, a vida terá um brilho delicioso, sem que, para isso, precisemos renunciar à nossa potência.
https://super.abril.com.br/ciencia/8-coisas-que-mostram-como-o-amor-pode-realmente-funcionar-como-uma-droga/
Livro: Mulheres que amam demais (Robin Norwood)
Este livro trata de mulheres que se encontram em relacionamentos destrutivos, muitas vezes movidas por paixões obsessivas. Norwood aborda a dependência emocional que algumas mulheres desenvolvem em suas relações amorosas, fazendo um paralelo entre essa dependência e um vício ajudando a entender e superar esse tipo de dinâmica.
Filme: Retrato de uma jovem em chamas (disponível em Amazon prime video)
Este filme francês foi amplamente aclamado pela crítica. Ele conta a história de um romance proibido entre uma pintora e a mulher que ela foi contratada para retratar. A intensidade da paixão entre as duas protagonistas cresce ao longo do filme, mas é marcada pela inevitável separação. "Retrato de uma Jovem em Chamas" explora a paixão de maneira profunda, sutil e devastadora, mostrando como o desejo pode ser ao mesmo tempo inspirador e destrutivo.
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Com Amor e Afetos ativos,
Jéssica Petit
O que é amar ativamente, Jéssica?